segunda-feira, 11 de junho de 2012


A Acessibilidade é um Direito Humano.

Para quem não me conhece pessoalmente, vou me apresentar: eu sou um cidadão com deficiência. Contraí uma doença quando criança, poliomielite, mais conhecida como paralisia infantil. Consta na Classificação Internacional de Doenças – CID o código B91, sequela de poliomielite.
Tenho por isso o corpo frágil, a musculatura atrofiada, e para me locomover utilizo uma cadeira de rodas motorizada.
Faço muitas coisas: modestamente, sou uma liderança no movimento de pessoas com deficiência, coordeno a Pastoral das Pessoas com Deficiência da Arquidiocese de São Paulo, realizo várias outras atividades ligadas aos direitos das pessoas com deficiência, trabalho, sou casado, tenho duas filhas.
Milito nessa área há 35 anos.
Ás vezes nossas vidas entram em estatísticas de maneiras estranhas e inesperadas.
Levantamento divulgado pelo IBGE na sexta-feira, 25 de maio, indicou que apenas 4,7% das ruas do Brasil possuem rampa de acesso para pessoas que utilizam cadeiras de rodas, sendo que na cidade de São Paulo esse percentual é de 9,2%.
Frequentemente vou à Cúria Metropolitana, seja para entregar a prestação de contas da Pastoral para a Ruth Maria, seja para alguma reunião que aconteça por lá.
Felizmente moro perto, a Cúria Metropolitana fica na Av. Higienópolis, no Bairro de Higienópolis, e eu moro na Rua das Palmeiras, no Bairro de Santa Cecília.
Sempre que vou à Cúria, vou andando em minha cadeira motorizada. Atravesso, para chegar até lá, dez ruas, sendo que nove contam com guias rebaixadas nas faixas de travessia, e uma não. Neste caso, nesse trajeto, 90% das ruas contam com rampas de acesso para usuários de cadeiras de rodas.
Bem superior ao índice apontado pelo IBGE acima, onde apenas 9,2% das ruas de nossa cidade contam com rampas de acesso.
Justamente a rua que não conta com guia rebaixada fica em meu bairro, Santa Cecília, que é um bairro mais popular, diferentemente de Higienópolis, onde fica a Cúria, que é um bairro mais elitizado.
É gritante diferença entre essas duas pesquisas, claro que a minha é uma observação empírica, sem valor científico algum.
Uma das questões a se destacar nestes dois casos está na distribuição dessas rampas de acesso. Na região onde está localizada a Cúria, por exemplo, todas as travessias do entorno estendido para vários quarteirões, possuem guias rebaixadas. É uma região privilegiada, com moradores de altíssima renda. As rampas de acesso dessa região, assim como as calçadas, estão bem conservadas.
Quando nos afastamos um pouco mais desse entorno, voltando para Santa Cecília, indo para Campos Elísios, Barra Funda, e mesmo a região do Centro, as rampas de acesso começam a rarear em várias travessias e o estado de conservação cai drasticamente. Ainda é possível a minha locomoção por esses bairros, com mais dificuldade. Muitas vezes sou obrigado a realizar a travessia fora da faixa de pedestres utilizando o rebaixamento de estacionamentos e garagens.
Indo mais para a periferia a locomoção de pessoas que utilizam cadeiras de rodas é impossível pelas calçadas, inexistem rampas de acesso e as calçadas, quando existem, são de péssima qualidade e péssima conservação.
A Av. São Mateus, por exemplo, é um caso típico dessa má distribuição de rampas de acesso, (má distribuição de oportunidades, de riquezas).  É uma avenida longa, muito movimentada, e com pouquíssimas rampas de acesso. As poucas encontradas, bem feitas e bem conservadas, estão junto à calçada de um condomínio particular, que resolveu fazê-las por iniciativa própria.
Faltam guias rebaixadas na periferia como faltam escolas, postos de saúde, segurança, etc.
Ao lutarmos por acessibilidade, e por tudo o que essa palavra significa para nós,  ao lutarmos por mais e melhores guias rebaixadas, estamos defendendo um Direito Humano, um direito que possibilita a mim, uma pessoa com deficiência, e a muitíssimas outras pessoas com deficiência caminharmos em direção à equidade de oportunidades e de participação, que é uma das condições para que a justiça social aconteça, também para nós.
Eu sou Tuca Munhoz. O fato de eu ser um cidadão com deficiência faz com que eu não possa andar por 90,8% das ruas da cidade de São Paulo.
O inacessível é inaceitável!
Tuca Munhoz