quarta-feira, 11 de abril de 2012

Anões, mídia e deficiência



Agradeço aos organizadores deste seminário a oportunidade de compartilhar com vocês um pouco da minha experiência e algumas inquietações que cercam a vida de pessoas que, como eu, têm uma deficiência. Estou saindo de uma gripe muito forte, portanto, perdoem a voz e a respiração mal colocada.
Falar de uma questão que me diz respeito é um desafio, até porque sou mais dos bastidores do que do palco. Como tratar de tema tão delicado, evitando cair na vitimização, no paternalismo, no heroísmo, no fetiche, no clichê, no estereótipo? Falar com serenidade das dificuldades do dia a dia – e elas existem! – encarar a diferença, e a repercussão dessa diferença, no meio em que vivemos não é tarefa fácil. Mas é tarefa necessária, imprescindível nesses tempos em que tanto se discursa pela inclusão, acessibilidade, diferença, pluralidade.
A sociedade reserva um determinado lugar para aqueles que fogem aos padrões de normalidade sobre os quais o mundo está estruturado. Ninguém se espanta, por exemplo, ao ver o negro como porteiro, operário, empregada doméstica, porque este é o espaço que lhe cabe. Assim como ninguém se admira ao ver o homossexual como costureiro, cabeleireiro, fazendo o gênero pitoresco, irônico, de humor fino, ferino. O anão divertindo as pessoas, dando cambalhotas, sendo alvo de chacota, ou como figura mágica, também não espanta. É o que lhe cabe nesse latifúndio.
Partindo do universo dos bufões, desde a antiguidade os anões são pessoas marcadas pelo estigma de garantir a diversão de outros, de fazer rir, expondo-se de qualquer maneira. Vê-los assim, os bobos da corte, é perfeitamente natural. Vê-los responder ao discurso já dado sobre eles não espanta ninguém. Chega a ser condição para que sejam incluídos. O espanto surge no momento em que rompem esses espaços. É aí que a diferença grita, assume outras proporções e a sociedade se defronta com o que não quer admitir: a rejeição, o preconceito. Já não está mais diante do estereótipo, do ser mítico, quase distante e, sim, da pessoa real, de carne e osso, com sentimentos, paixões, contradições e a sua DIFERENÇA. Diferença com a qual a sociedade não sabe lidar.
É aí que o deficiente, seja por razões físicas ou mentais, instaura a desordem num mundo aparentemente normal, desorganiza a frágil organização da sociedade. E as pessoas se enfrentam com a dificuldade e a necessidade de lidar com uma realidade que não querem ver: tratar o deficiente na exata medida do seu problema, com naturalidade. Ao ignorar ou excluir as diferenças certamente toma-se o caminho mais fácil e mais curto para a eliminação do humano, do caráter criativo e inusitado dos homens, que está no encontro das suas múltiplas possibilidades e capacidades. Cabe, portanto, a nós, com a nossa dificuldade, subverter a ordem, extrapolar os espaços e recusar os papéis já dados, como o do bufão, o do “coitadinho”, da vítima ou o do herói. Se para a sociedade é difícil conviver com a diferença, é fundamental fazê-la entender o valor e as possibilidades que as diferenças trazem. Resta-nos aprender juntos, fora dos estereótipos e dos discursos já instituídos, velhos e redutores.
Além do acesso físico, sem dúvida fundamental, a pessoa com uma deficiência precisa ser acolhida com a sua dificuldade, sem disfarces e pré-julgamentos; na sua dimensão real, sem contaminações, sem transformar-se em exemplo. Só assim construiremos relações mais humanas, definitivas para a eliminação do preconceito. “Ver com os olhos livres”, como disse o escritor Oswald de Andrade no Manifesto Antropofágico nos anos 20 do século 20. Se for quase impossível adaptar a cidade às nossas necessidades, é perfeitamente viável contar com a consciência de nossa existência. No caso dos anões, por exemplo, ser atendidos fora dos imensos balcões dos bancos, já será um avanço.
A mídia tem um papel fundamental neste sentido: mostrar a vida como ela é tratar de questões que envolvem a deficiência e o preconceito com naturalidade. É formadora de opinião, por isso tem uma enorme responsabilidade. Não pode ser linear e burocrata em suas análises e comentários. É importante que instigue, faça pensar, evitando o sensacionalismo, que não contribui em nada para causa nenhuma. Precisamos de mais civilidade, mais grandeza, mais humanidade e mais sabedoria ao tratar de temas delicados como esse.
Nós, os anões, somos poucos e pouco lembrados, quase invisíveis para a sociedade e os governos. Mas temos belos exemplos de reportagens sobre o nanismo. Desde os anos 80, procuro acompanhar o assunto na mídia. Nessa época, uma matéria de página inteira no jornal O Estado de São Paulo, com um título muito sintomático e sensível "A solidão desta gente pequena" chamou muito a minha atenção. Talvez aí eu tenha mergulhado definitivamente na minha condição. Há mais de 35 anos, a reportagem era pontual e trazia vários depoimentos de anões. Na verdade, trazia todas as questões que discutimos hoje, depois que inclusão e acessibilidade tornaram-se palavras da moda, politicamente corretas.
Mais recentemente, em novembro de 2009, a reportagem feita pela jornalista Fernanda Zaffari para o Caderno Donna de Zero Hora, na qual minha irmã e eu fomos entrevistadas, foi de uma delicadeza rara, absolutamente fora dos estereótipos. Tratou do problema com naturalidade e nos mostrou como pessoas que vivem como qualquer outra. A repercussão dessa matéria ainda hoje nos surpreende.
Mas temos também péssimos exemplos de tratamento aos anões na mídia, especialmente em programas de televisão e rádio. Por uma dessas falhas de memória que Freud deve explicar, esqueci as datas, mas vale registrar. Comunicadores de programas como Manhattan Connection/GNT e Pretinho Básico/Rádio Atlântida fizeram comentários absolutamente infelizes e preconceituosos sobre os anões. Só viram o estereótipo, sem nenhum contraponto. Pelo discurso deles, quase nazista, não é delegado ao anão um comportamento humano. Como todo comunicador, que precisa ser interessante e preencher um espaço sem pensar e sem questionamentos, eles ironizaram grosseiramente a condição de vida dos anões, absolutamente presos ao estigma, demonstrando farta ignorância sobre a diferença e a deficiência.
Para encerrar, lembro duas frases de canções de Caetano Veloso, que podem funcionar como uma bússola nessa nossa jornada: "Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é" e "De perto ninguém é normal". Não somos nem vítimas nem heróis. Estamos na vida como qualquer pessoa, com a nossa dificuldade.

Lelei Teixeira - Jornalista
Seminário Mídia e Deficiência - Assembléia Legislativa do Estado do RS.
Porto Alegre, 27 de julho de 2011.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Que bicho é esse??


Reflexões sobre o bicho da corrupção.

Tem se falado muito nos últimos dias sobre o bicheiro Carlinhos Cachoeira e sua rede de corrupção e outros trambiques envolvendo autoridades, órgãos de imprensa, empresários e outros bichos.
Muito interessante e significativo o fato de um dos arautos da moralidade e do combate à corrupção seja aliado e, praticamente, um empregado desse corruptor.
Mas, o que me causa profundo incomodo e indignação é a hipocrisia e a falsa moral de muitos, da imprensa, por exemplo, pois o jogo do bicho é absolutamente presente no dia a dia de milhões de pessoas, e aqui em meu bairro, Santa Cecília, e já coloquei isto aqui anteriormente, existem vários e muito conhecidos pontos de jogo. Não só de jogo do bicho, mas também de vídeo pôquer e outros jogos ilegais.
Como fica essa situação? A polícia desconhece isso? A Secretaria de Segurança do Estado de São Paulo desconhece isso? A imprensa desconhece? E as pessoas que jogam ou que simplesmente passam em frente a esses pontos de jogos ilegais o que pensam disso? Ignoram que esse pequeno ponto de aposta faz parte de uma enorme rede de corrupção, crimes, lavagem de dinheiro e sabe-se lá mais o que? Onde e como esse dinheiro é lavado? A quais e a quantos representantes dos poderes públicos chega esse dinheiro?
Todos nós compartilhamos um pouco dessa hipocrisia! Calamo-nos por medo, preguiça, ou aquela sensação de que não vai adiantar nada protestar.
Ou somos corrompidos também?

quarta-feira, 4 de abril de 2012

A inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior


A INCLUSÃO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR[1]
MASINI, Elcie[2] A.F.S. – UPM
BAZON, Fernanda[3] V.M. – UPM
GT: Psicologia da Educação / n.20
Agência Financiadora: CNPq
                 

Introdução

Inclusão, desde 1998, tem constituído tema de programas de Graduação e Pós-graduação nas Universidades, em Eventos Científicos, na política educacional do governo, nas reivindicações e movimentos a favor da pessoa com deficiência, em publicações e notícias nos meios de comunicação.
A premência de medidas referentes às condições necessárias para inclusão de alunos com deficiências, no ensino regular, tem desencadeado pesquisas sobre a inclusão, sob diferentes perspectivas, tais como: a formação de professores para a proposta de educação inclusiva (CAMEJO, 2000); a reação das mães frente à inclusão de uma criança com deficiência na classe de seu filho (MOLOCHENCO 2003); estudos sobre inclusão do aluno com deficiência na escola regular (SOLÉR, 2003; VOIVODIC, 2003); impactos iniciais da inclusão da criança com deficiência no ensino regular (ANDRETTO, 2001).
Na coordenação de pesquisas, na área da educação de alunos com deficiência visual, realizadas junto ao Laboratório Interunidades de Estudos sobre Deficiências (LIDE) e financiadas pelo CNPq; em assessorias a Serviços de Educação Especial de Secretarias de Educação de cidades do Estado de São Paulo, temos nos deparado com um número crescente de crianças com deficiência visual inseridas em instituições educacionais de ensino regular, no ensino fundamental e médio. Contudo, referente ao ensino superior, com exceção da pesquisa de Mestrado de Delpino (2004) não temos conhecimento de qualquer investigação específica sobre o processo de inclusão de alunos com deficiência no ensino superior.
Esta investigação oferece depoimentos de alunos com três diferentes tipos de deficiência, sobre suas atividades, participação, significados e sentimentos em seus cursos em instituições de ensino regular. É uma pesquisa realizada junto a 12 estudantes universitários: quatro com deficiência visual, quatro com deficiência auditiva severa e profunda; quatro com paralisia cerebral. Constitui o registro de entrevistas com alunos de diversos cursos e instituições e a análise do que favorece e do que dificulta a inclusão desses alunos.
A relevância desta pesquisa está em: sistematizar informações sobre a qualidade do trabalho de inclusão educacional e social de alunos no ensino superior; analisar dados de estudantes com três diferentes tipos de deficiência, verificando se há especificidades requeridas para cada um dos tipos e oferecer a perspectiva do próprio aluno com deficiência sobre sua experiência no ensino superior.
            Buscando oferecer uma contribuição concreta sobre a inclusão de estudantes universitários com deficiência, esta investigação visa alcançar os seguintes objetivos:

·       analisar as situações e recursos que favorecem a inclusão do aluno com deficiência no ensino superior;
·       arrolar as condições que propiciaram a inclusão, do ponto de vista educacional e social e o que foi feito para que ocorresse;
·       especificar o que fez com que o aluno com deficiência se sentisse integrado e incluído, no que diz respeito a atitudes humanas e condições materiais;
·       verificar se há especificidades requeridas para a inclusão de alunos com deficiência     visual,  com deficiência auditiva, com paralisia cerebral.

O que é inclusão?

Inclusão, do verbo incluir (do latim includere), no seu sentido etimológico, significa conter em, compreender, fazer parte de, ou participar de. Assim, falar de inclusão escolar é falar do educando que está contido na escola, ao participar daquilo que o sistema educacional oferece, contribuindo com seu potencial para os projetos e programações da instituição.

O movimento pela inclusão no Brasil, crescente a partir da década de 90, originou - se de diversas influências, entre as quais: a luta européia de oposição à exclusão da pessoa com deficiência mental do convívio social, que em 1960, deu origem à Liga Internacional pela inclusão, Inclusion International, originária da Bélgica e que se estendeu pela Europa, África, Indonésia, Índia, Austrália, Hong Kong e Américas; a proposta integracionista dos Estados Unidos da América, que em São Paulo na década de 1950, foi realizada experimentalmente no Instituto de Educação “Caetano de Campo”, onde teve início a primeira sala de recursos para deficientes visuais estudarem em classes comuns; a conferência internacional realizada em Salamanca em 1994, na qual foi reafirmado o compromisso com a “Educação para Todos” ficando decidida a inclusão de crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais no sistema regular de ensino, devendo a escola atender às necessidades de cada um reconhecendo suas diversidades.
Da situação da inclusão escolar no Brasil, de 1998 a 2004, pode – se assinalar algumas características, entre as quais:
·       a adoção da declaração de Salamanca nas diretrizes educacionais dos órgãos federais e estaduais, garantindo, em decretos oficiais, a matrícula de crianças com deficiência nas escolas regulares;
·       a inserção do tema inclusão em programas e eventos científicos, em reivindicações ligadas às pessoas com deficiência, em publicações e nos meios de comunicação;
·       a constatação de que a Educação não propicia a inclusão ao matricular de forma indiscriminada alunos com deficiência, sem realizar estudos sobre as condições específicas requeridas e o correspondente preparo de professores e transformações no contexto das escolas, para o atendimento da criança com deficiência.
O movimento de inclusão no Brasil tem sido acompanhado de aplausos e de reprovações. De um lado há concordância a respeito da inclusão como oposição à exclusão de pessoas com deficiências no ensino regular. Neste sentido todos passam a defende - lá e ninguém se arriscaria a pronunciar-se contra ela. De outro lado, há discordância quanto à inclusão indiscriminada, na qual, sem qualquer avaliação prévia é matriculado o aluno com deficiência na escola regular e sem análise de suas condições e das necessidades requeridas para seu atendimento, quer do ponto de vista de recursos humanos, quer do ponto de vista das adaptações físicas e materiais.
A educação inclusiva, segundo Dens (1998) abandona a idéia de que só a pessoa normal pode contribuir; volta – se para o atendimento às necessidades daquelas com deficiência e para tal requer um currículo apropriado. Contudo, isso é necessário, mas não suficiente, pois como afirma esse autor, ainda que se providencie todos os recursos pedagógicos faz – se, também, necessária a mudança de ideologia e esta é uma transformação lenta. Este posicionamento pode ser identificado com a luta de Basaglia e Ongaro (1968, 1971) contra a internação institucional do doente mental, em defesa de sua integração social. A esse respeito assegura Basaglia (1975) que se se quer transformar a realidade - e a realidade é esta da qual dispomos – permanece sempre o problema da contemporânea transformação de nós mesmos. Mas essa transformação do homem é a mais difícil, impregnados como somos de uma cultura que se fecha a quaisquer contradições – por meio da racionalização e do refúgio na ideologia que enfatiza e toma em consideração um só pólo. Ressalta o autor a necessidade de modificações em diversos planos, para mudar a realidade – no plano da ação social, como também no da transformação subjetiva, movendo internamente a inércia do homem na relação consigo mesmo e com os outros. Sob essa perspectiva Basaglia define seu conceito social de cura, que implica uma sociedade que duvide da exclusão social, trazendo em seu âmago a crença na inclusão.
O enfoque social predominante nesse conceito de cura assemelha - se ao enfoque da inclusão da pessoa com deficiência, que de diversas formas vem assinalando ser este um problema da sociedade e que seus paradoxos e resistências têm que ser encontrados no sistema socialRieser (1995) propõe que se fique atento às barreiras sociais que não estão diretamente ligadas à deficiência, mas a preconceitos, estereótipos, discriminaçõesa Classificação Internacional da Funcionalidade (OMS, 2001) surge como instrumento para avaliar a qualidade de vida pela funcionalidade e pela condição sociocultural na qual o indivíduo está inserido.
No Brasil, no que se refere a questão da inclusão de estudantes com deficiência na escola regular, tanto professores universitários especialistas no assunto, como profissionais que atuam diretamente com esses alunos têm se referido ao que propicia e ao que constitui dificuldade à sua realização. Entre os professores universitários Mazzotta (1998) enfatiza a necessidade de, além dos ideais proclamados e das garantias legais, conhecer as condições reais da educação pública e obrigatória, para identificar e dimensionar os principais pontos de mudanças necessárias; Bueno (2001) refere à necessidade de apoio ao trabalho docente, para implementar processos de inclusão. A opinião a respeito da viabilidade da inclusão dos que estão na prática das escolas – de professoras e orientadora educacional especializadas em deficientes visuais, professor de educação física e uma psicóloga, pertencentes à Educação Especial da Secretaria de Educação da Prefeitura de São Bernardo, no Estado de São Paulo, em 1999 - apontou o que segue. Para que ocorra a inclusão é necessário união entre a escola e a comunidade; um processo gradativo com estudo, planejamento, orientação à família e à comunidade; equipe suficiente, com preparo e disponibilidade; equipamento apropriado e serviços de apoio técnico e pedagógico. Sem essas condições a inclusão não ocorre.
Alguns especialistas em educação especial apresentam sugestões de recursos necessários à efetivação da inclusão escolar. Mrech (1998) propõe:
·       aconselhamento aos membros da equipe para desenvolverem novos papeis para si e para os demais profissionais envolvidos;
·       auxílio na criação de novas formas de estruturação do processo ensino aprendizagem, direcionados às necessidades dos alunos;
·       oportunidade de desenvolvimento aos membros da equipe;
·       apoio ao professor de sala comum em relação às dificuldades de cada aluno e de seus processos de aprendizagem;
·       compreensão, por parte dos professores, da necessidade de ultrapassar os limites de cada aluno a fim de leva–lo a alcançar o máximo de sua potencialidade;
·       possibilidade de que os professores tenham acesso a alternativas para implantação de formas adequadas de trabalho.
Masini (1999) ressaltando a responsabilidade dos envolvidos diretamente no processo de inclusão escolar, assinala a necessidade de que:
·       cada um conheça seus próprios limites, pessoais e de formação e no que pode contribuir  para a inclusão do aluno com deficiência;
·       sejam examinadas as condições e limites das escolas;
·       sejam analisadas as formas possíveis para que a inclusão se realize em benefício do estudante com deficiência;
·       façam projetos educacionais em uma dialética teoria/prática, com constante avaliação do que ocorre com o aluno com deficiência.
Enfatiza (Masini 2000) a importância de investigações que forneçam dados sistematizados e analisados sobre experiências de inclusão de alunos com deficiências em escolas, identificando:
·       como fazer a inclusão no que diz respeito aos recursos humanos e materiais;
·       com quem, ou seja, quais os alunos a serem integrados e incluídos;
·       onde serão incluídos, tanto do ponto de vista educacional como social;
·       o que se objetiva da inclusão;
·       condições oferecidas para que ocorra.

1. Investigando a Inclusão no Ensino Superior
Esta investigação sobre a inclusão de estudantes no Ensino Superior fundamentou - se em trabalhos e pesquisas sobre inclusão da pessoa com deficiência na escola e na sociedade, buscando um maior vínculo entre os aspectos teóricos e práticos do atendimento ao estudante com deficiência.
É no dinamismo e na complexidade das interações do ser humano no seu dia a dia, com pessoas e objetos que o cercam, que ocorre seu desenvolvimento. Por essa razão a análise das situações educacionais enfatizou a importância de não se perder de vista o dinamismo e complexidade das interações que ocorreram na vida do estudante, tanto na instituição educacional, como em sua vida extra escolar. Daí ter-se proposto uma análise dos depoimentos dos entrevistados, nas interações pessoais e ligadas ao seu aprender, focalizadas na totalidade do afetivo, perceptual e cognitivo, sob diferentes ângulos: o dito sobre si próprio, sobre seus envolvimentos na educação informal (com familiares, amigos vizinhos, em atividades recreativas e sociais) e na educação formal (com professores colegas e outras pessoas da instituição).
A análise dos depoimentos implicou constante diálogo entre a pesquisadora e os auxiliares, o que exigiu sistemáticos encontros e discussões entre esses profissionais envolvidos. A interação entre os componentes da equipe da pesquisa é que permitiu que os dados se complementassem e fornecessem elementos para se compreender o que favoreceu a inclusão e o que a impediu.

1.1. Procedimento
Reuniões gerais da equipe para: apresentação de toda a equipe e discussão do projeto;  discussão e divisão das responsabilidades; preparo dos auxiliares para as entrevistas; organização do roteiro das entrevistas;  definição, sobre quais sujeitos cada auxiliar iria entrevistar; discussão sobre a forma de registro das entrevistas; supervisão do andamento das entrevistas e discussão sobre dúvidas; discussão sobre método de análise; explicações e exemplificação sobre as etapas de análise; exercício e discussão sobre cada etapa de análise.
           
1. 2. Sujeitos da pesquisa
·       12 estudantes com três diferentes tipos de deficiência 4 com deficiência visual; 4 com deficiência auditiva severa e profunda; 4 com paralisia cerebral.

A seleção dos(as) estudantes (as) sujeitos da pesquisa assim ocorreu:
·       os estudantes com deficiência visual foram indicados pela Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual - LARAMARA;
·       os estudantes com deficiência auditiva e paralisia cerebral, foram indicados por profissionais ligados ao atendimento educacional de pessoas com deficiência auditiva e com paralisia cerebral.

1. 3. Material da pesquisa
·       relato escrito de entrevistas gravadas, realizadas a partir de um roteiro utilizado para assegurar que os três entrevistadores obtivessem respostas a alguns itens básicos;
2. Método

2.1. Coleta de Dados
As entrevistas seguiram alguns princípios gerais da Pesquisa Participante, apresentados a seguir (Brandão, 1981):
A) Preocupação de que a pesquisadora esteja atenta:
·       à própria participação, tanto quanto está atenta ao pesquisado, buscando interagir autenticamente, sem encobrir-se com princípios teóricos, dogmáticos;
·       à sistematização da própria participação por meio de um ritmo e equilíbrio na ação e reflexão, auxiliado por técnicas dialogais.
B) O compromisso da pesquisadora com algum problema social, para o qual busca uma ação transformadora (no caso sistematização de condições que propiciam a inclusão educacional e social de alunos com deficiência

2.1.1. Forma de registro
A forma de registro e análise foram feotps em um enfoque fenomenológico.
Na coleta de dados, buscou-se a facticidade das situações educacionais, isto é, o registro do vivido no cotidiano, da vida fora e dentro da escola, em sala de aula e em outros ambientes escolares, para perceber o(a) estudante (a) em suas relações (com familiares, amigos, vizinhos, colegas, professores e funcionários) e em seu processo de aprendizagem. Para ter acesso a essa experiência, fez-se uso do Método Fenomenológico, que trata de desvelar o fenômeno e pô-lo a descoberto, renunciando à atitude de apenas constatar ou comprovar dados para, indo mais além, buscar compreendê-los na totalidade da vida da pessoa com quem se lida.
Assim, nesta investigação do cotidiano, do vivido em diferentes situações, deixou-se de lado a atitude de recolher dados pré-estabelecidos e padronizados, para registrar o mais amplamente possível tudo o que a pessoa aí fazia e expressava, nas suas relações com outras pessoas e com o material ensinado, para compreende-la na totalidade das suas manifestações corporais, afetivas, sociais, e cognitivas
O registro constituiu o primeiro passo do Método, ou seja, a Descrição, conforme explanação a seguir.

Descrição- 1o passo do Método Fenomenológico
A Fenomenologia é descritiva em seu enfoque, em oposição à explanação e à construção, que são, respectivamente, tarefas da ciência e da filosofia, tradicionalmente.
Os entrevistadores registraram aquilo que cada entrevistado manifestou verbal e gestualmente, com palavras do cotidiano. Esta descrição revela uma consciência ingênua, e é condição para captar o fenômeno, pois é uma consciência anterior a qualquer classificação ou explicação. Os entrevistadores foram descrevendo o que se apresentou na situação relatada pelo entrevistado(a). Como o interesse era na experiência do(a) aluno(a), foi importante o registro do que foi dito, como foi dito, a entonação de sua voz, seus gestos, sua expressão, enfim tudo que cada um mostrou, nas diferentes situações relatadas. Foi importante, o registro referente ao que o(a) estudante mostrou junto às pessoas com que se relacionava, bem como o que ele explicitou referente à  realização de suas atividades escolares.

2.1.2. Análise de Dados
Interpretação – 2o  passo do Método Fenomenológico
A pergunta que guiou a análise foi: quais as condições que facilitaram a inclusão do(a) estudante e quais a impediram? Partindo dessa pergunta orientadora, buscou-se compreender o que se passou em cada situação. Para isso recorreu-se ao Método Fenomenológico de investigação. A pesquisadora e auxiliares voltaram - se para a ação humana buscando seus significados nas situações vividas, relatadas pelos(as) entrevistados(as) e registradas por escrito. Nesse sentido, buscaram compreender o que ocorreu relacionando os dados. Fez-se assim uma Interpretação conforme explicitações apresentadas a seguir.
A pesquisadora e auxiliares procuraram atingir o significado da maneira do(a) aluno(a) agir, retirando de sua Descrição das várias situações, as características que foram sendo desveladas em diferentes momentos. A Interpretação fenomenológica foi assinalando as ações do(a) aluno(a) nas situações e os significados que indicaram condições de inclusão e impedimentos. A interpretação foi fruto do que foi percebido do vivido, relacionando tudo aquilo que foi registrado na Descrição, sem utilizar no entanto qualquer quadro categorial como referência. Foi a retomada do que apareceu na Descrição que possibilitou à equipe acesso ao sentido dos estudantes com deficiência, em suas ações na vida cotidiana e nas escolas.
É importante lembrar que a Interpretação da pesquisadora e auxiliares é uma maneira pessoal de perceber e compreender os dados da Descrição. O que assegura essa melhor compreensão do processo de inclusão é uma Descrição bem feita, que ofereça material para a Interpretação.
A Interpretação foi feita em 4 etapas: 1a) Levantamento de significados de cada aluno; 2a) Convergências de significados: dos alunos com deficiência visual; dos alunos com deficiência auditiva; dos alunos com paralisia cerebral; 3a) Convergências gerais dos alunos dos três grupos; 4a) Reflexões sobre os dados e Comentários.

3. Resultados
3.1. Convergências gerais das condições que favorecem:

Agentes


Condições que favorecem

Exemplos de Situação de ocorrência

Professores
Professores adequados e abertos às necessidades da aluna, solícitos e dispostos a contribuir, fazendo modificações conforme a necessidade da aluna. (7/12)



Um aluno com deficiência auditiva   disse que professor de ginástica, na faculdade, falava bem devagar com ele e a comunicação era ótima.


Colegas e amigos
Ter um bom contato e receber ajuda dos colegas de classe (7/12).


Sair com amigos para fazer atividades de lazer (8/12).




Ser bem recebida e aceita pelos colegas (3/12).
Os colegas emprestavam o caderno para copiar para um aluno com paralisia cerebral.

As alunas com deficiência visual relataram que saíam no fim de semana para ir ao shopping, cinema lanchontetes

Item descrito pelos alunos com paralisia cerebral, por exemplo uma festa de despedida para um destes alunos.

Família
Apoio, estímulo e busca por educação e independência. Apoio da mãe (10/12)



Receber a ajuda do irmão (5/12).








Ajuda da família para acompanhar a escola (6/12).




Respeitar os limites do filho. Aceitar a deficiência (4/12)
Morar longe dos pais para complementar seus estudos; ir de metrô e ônibus para a escola (alunas com deficiência visual).

Um estudante com paralisia cerebral disse dar – se bem com a irmã, que indicou a faculdade que tinha a estrutura física adequada para ele (rampas, banheiro especial), levando – o; saindo juntos com os amigos.

Uma estudante com deficiência visual citou que a mãe fez o ensino médio junto com ela, matriculando-se na mesma escola.

Um estudante com paralisia cerebral comentou que a mãe o aceitou bem o pai porém aceitou-o só depois da comprovação de sua inteligência era normal.

Próprias










Fazer atividades culturais e artísticas (3/12).


Pedir bolsa de estudo na faculdade (2/12).




Trabalhar (6/12)

.


Sentir-se como os demais, ter força de vontade, fazer planos e aceitar a deficiência (9/12).





Fazer solicitações aos professores para que oferecessem melhores condições de aprendizagem e para os colegas para receber ajuda (4/12)


Reivindicar e denunciar atitudes de preconceito (3/12)




Ser dedicado nos estudos e concentrar-se nas aulas. (6/12)




Dominar a língua de sinais. (4/12)




Possuir expectativas profissionais (6/12)
Um estudante com deficiência visual citou o curso de violão 


Duas estudantes com deficiência visual conseguiram Bolsa de Estudos nas Universidades particulares em que estudavam.

Uma estudante com deficiência auditiva falou de seu trabalho como auxiliar administrativa em uma empresa

Um estudante com deficiência auditiva expôs sua forma de agir: fazendo amizades, na Internet, com outros surdos, tornando-se uma pessoa mais aberta.


Duas estudantes com deficiência auditiva disseram que sempre pediram para os professores falarem devagar e de frente para elas.


Uma estudante com paralisia cerebral processou a faculdade, por discriminá-la não permitindo que fizesse Psicologia.

Uma aluna com deficiência auditiva falou do seu acompanhamento na escola na qual sempre conseguiu ser boa aluna

Os quatro estudantes aprenderam   LIBRAS de diferentes formas e apontaram sua importância.

Uma estudante deficiente visual referiu-se a seus planos, busca estabelecer um plano de carreira, para trabalhar no setor de recursos humanos.

Contexto social
A deficiência traz vantagens (3/12)
Um aluno com paralisia cerebral contava com transporte especial gratuito oferecido pela prefeitura, que o levava e buscava na Universidade.
Instituições
Contratar intérpretes para os alunos com deficiência auditiva (3/12)




Ledores (2/12)





Uma Associação particular oferecer bons profissionais e apoio. (2/12)
Três Universidades particulares onde estudavam três dos alunos com deficiência auditiva estavam providenciando contratação de intérpretes.

Duas das estudantes com deficiência visual referiram – se ao auxílio dos ledores para compensar a falta de livros em braile.

Dois alunos com paralisia cerebral   estudaram nessa Associação e referiram muita gratidão por isso.


3.2. Convergências Gerais de condições que dificultam:


Agentes

Condições que Dificultam

Exemplos de Situação de Ocorrência
Professores
Falta de preparo e de interesse em ensinar o aluno deficiente. (9/12)


Discriminar e possuir preconceito em relação ao aluno com deficiência. (3/12)
Uma aluna com deficiência visual falou da recusa do professor em fazer provas ampliadas

Uma aluna com paralisia cerebral destacou a atitude do professor que desaconselhou-a a fazer o curso escolhido.

Colegas e amigos
Falta de aceitação. Desconhecer a deficiência e não lidar com a pessoa adequadamente. (10/12)


Um dos entrevistados com paralisia cerebral citou a discriminação dos colegas: recusa em emprestar material.

Família

 


Superproteção (6/12).







Apresentar dificuldade em aceitar a deficiência. (3/12)



Três alunas com deficiência visual ressaltaram que a superproteção familiar como um fator que dificulta os relacionamentos e a aquisição de independência.


Dois alunos com paralisia cerebral destacaram atitudes inapropriadas da família e a confusão entre deficiência física e mental.

Próprias
Ter dificuldades na escola ou não gostar da mesma. (4/12)



Não trabalhar (4/12)




Insegurança, desconfiança e preconceito em relação a outras pessoas ou ter afinidade apenas com pessoas com deficiência visual (3/12).

Problemas para aceitar a deficiência (3/12)




Ter que pedir ajuda aos colegas:   para alimentar-se e pegar a matéria. (2/12)



Dificuldade na comunicação social.
(2/12)

Uma universitária com deficiência auditiva disse que nunca foi boa aluna.


Os alunos com paralisia cerebral destacaram que tem dificuldade em conseguir empregos formais.

Uma aluna com deficiência visual relatou seu preconceito com relação às outras pessoas como   quando estas não levavam em conta suas opiniões.

Uma estudante com deficiência visual falou que teve problemas para aceitar suas limitações, inclusive falar com os pais sobre elas.

Dois alunos com paralisia cerebral relataram o fato de pedir ajuda para alimentar-se, para copiar a matéria ou tirar xerox do caderno.

Dois entrevistados com paralisia cerebral citaram que as pessoas dizem que não entendem o que eles falam .

Instituições

“Barreiras arquitetônicas” (falta de rampa de acesso, banheiro adaptado, elevador). (2/12)




Os quatro entrevistados com paralisia cerebral tiveram dificuldade para serem aceitos em escolas ou universidades.

Instituições

“Segregação” em instituições (1/12).
Uma aluna com deficiência visual ressaltou que apesar de instituições de atendimento serem boas para o seu desenvolvimento, limitam o contato com o mundo.

3. Discussão e comentários

A maioria dos alunos considerou a importância de aceitar a deficiência, possuir força de vontade para enfrentar as dificuldades e ter atitudes em direção à autonomia. Entre as atitudes foram citadas: locomover-se sem ajuda, andando de ônibus e metrô possuindo deficiência visual; empenhar-se nos estudos, procurando materiais e pedindo ajuda aos colegas; procurar um trabalho; utilizar os recursos sociais oferecidos à pessoa com deficiência como transporte gratuito, biblioteca com livros em braile.
Dez entre doze alunos salientaram o apoio, incentivo e o auxilio oferecido pela família para que esses pudessem estudar e adquirir autonomia. Na maioria dos relatos, houve prevalência do apoio da mãe em relação aos outros membros da família. O estímulo dos pais era percebido quando estes acreditavam no filho e propiciavam condições de independência. A maior parte dos apoios citados envolviam a ajuda dos pais nas tarefas escolares e no financiamento de cursos, professores particulares e especialistas. Houve também referência às ações que exigiam maior esforço e/ou modificações na rotina destes, como: aprender a dirigir para conduzir o filho a escola; conversar com os professores; treinar em casa os exercícios praticados pela fonoaudióloga;a família mudar-se de um Estado para morar em outro, onde se localizava a instituição que consideravam melhor para o filho; procurar escolas mais adequadas para este e batalhar por uma vaga.
Nove entre doze estudantes referiram-se à importância de sair com amigos para realizar atividades de lazer. As atividades citadas foram: ir ao cinema, barzinhos, discotecas, shopping, viajar e conversar. A maioria dos nove alunos, realizava as atividades com pessoas que conheceram na faculdade, colégio ou na instituição que freqüentavam. Um dos alunos saía apenas com um colega que possuía a mesma deficiência e uma das alunas saia na companhia de uma professora mais velha. Frente a esses dados cabe assinalar a maior dificuldade das pessoas com PC para sair.
Oito entre os doze alunos encontraram professores que se mostraram abertos e dispostos a auxiliá-los. Os professores atenderam as solicitações do aluno, realizando modificações de forma a minimizar a dificuldade relatada por este. Além disso, alguns professores preocupavam-se em adequar as condições oferecidas, ao aluno, perguntando para este o melhor modo de fazê-lo, ofereciam ajuda e acreditavam no aluno.
Sete entre doze alunos recebiam a ajuda dos colegas. Os tipos de ajuda citadas
foram: empréstimo de materiais; copiar a matéria utilizando uma folha de carbono embaixo de sua folha, disponibilizando uma cópia imediata para o colega; gravar a leitura do capítulo do livro em fita cassete, transcrever as respostas das provas, empurrar a cadeira de rodas e ajudar o colega a alimentar-se.
Quatro alunos referiram-se a ajuda recebida dos colegas da faculdade. No entanto, dois alunos receberam ajuda apenas durante o ensino fundamental e médio, mas não recebiam na faculdade.
Trabalhar foi considerado como uma condição que favorece a inclusão por sete entre doze alunos. Alguns desses alunos trabalharam,mas não estavam trabalhando na época da entrevista. Seis entre esses alunos, trabalhavam ou tinham trabalhado em instituições ligadas à deficiência, uma delas trabalhava em uma empresa em uma vaga reservada para pessoas com deficiência. Apenas um aluno exercia atividade correspondente ao curso superior que fazia. No entanto, ele trabalhava em casa de forma autônoma (como webdesigner). Tais dados evidenciam a dificuldade da pessoa que possui uma deficiência ser aceita no mercado de trabalho, fora do contexto que de instituições que lidam com a deficiência.
Seis entre doze alunos consideraram a importância de pedir ajuda a colegas e professores para consegui-la. Dessa forma, se dirigiram aos professores e expressaram suas dificuldades. Uma atitude não realizada com facilidade (diante do preconceito) e sujeita a recusas (como relataram alguns nas dificuldades),mas considerada necessária.
Metade dos alunos foi acompanhada pela mãe, irmão ou pessoas contratadas, na instituição de ensino. Os alunos com paralisia cerebral eram os que mais necessitavam desse tipo de ajuda em relação às outras deficiências. A existência de acompanhamentos deveu-se a uma exigência da escola para que os pais auxiliassem o filho na alimentação e higiene. Além disso, as mães e/ou acompanhantes copiavam a matéria da lousa, transcreviam as provas e conduziam a cadeira de rodas. Dois dos quatro alunos com paralisia cerebral, passaram a ser acompanhados, na faculdade, por uma pessoa contratada pela família.
Seis entre doze alunos enfatizaram o próprio empenho e/ou a facilidade nos estudos como uma forma de enfrentar as dificuldades e adquirir a autonomia. Esse empenho foi apresentado diante de dificuldades em relação a aprendizagem,com o intuito de supera-las e/ou reafirmar seu potencial.
Seis dos doze alunos possuíam planos profissionais. Os planos correspondiam à prática e aprimoramento da profissão para a qual cursavam, por exemplo: ser psicólogo escolar, jornalista, conseguir um estágio na área e fazer pós-graduação.
Itens específicos foram citados em cada um dos grupos. Duas entre quatro alunas
com deficiência visual ressaltaram a importância dos ledores no centro acadêmico da faculdade e na prova do vestibular. Todos os quatro entrevistados com deficiência auditiva ressaltaram a importância de dominar a língua de sinais, três consideraram essencial a contratação de intérpretes na faculdade e dois afirmaram que as mensagens de texto por celular e a Internet eram meios que facilitavam a comunicação. Fazer reivindicações e denunciar atitudes de preconceito foram atitudes presentes nos relatos de três dos quatro entrevistados com paralisia cerebral: denunciaram instituições de ensino superior para a imprensa e abriram processo contra as faculdades por ter sido impedida de inscrever-se no vestibular, por uma faculdade impedir a aluna de cursar Psicologia alegando que ela não tinha condições e outra, não adaptar as condições arquitetônicas do prédio para o aluno. Dois alunos ressaltaram a importância da uma instituição particular, para pessoas com a deficiência, que ofereceu bons profissionais e apoio.
Quanto ao que DEFICULTA A INCLUSÃO o único item ressaltado por todos os entrevistados foi a falta de aceitação na comunidade e o preconceito social. De diferentes formas, esse elemento é assinalado nos três grupos. Os estudantes com deficiência visual fizeram referência a situações escolares e sociais e uma aluna falou que o que mais a preocupava era o olhar das pessoas frente à deficiência. Os estudantes com deficiência auditiva fizeram referência à falta de preparo e interesse dos professores em ensinar o aluno deficiente, mostrando o despreparo das escolas, sobretudo das regulares. Os estudantes com paralisia cerebral sentiam-se excluídos, queixando-se da falta de auxílio oferecido pelos colegas e da dificuldade de relacionamento, não saindo com colega algum da faculdade para divertir-se; uma faculdade impôs que à aluna com paralisia cerebral que ela só se formaria se cursasse apenas até o quarto ano (obtendo somente o grau de bacharel; não o de psicóloga).
Nove dos doze relatos fizeram referência às relações com os professores: Falta de preparo e de interesse em ensinar o aluno deficiente.
Oito das doze entrevistas referiram - se às relações com os colegas, não ser solícito e discriminar o colega. Possuir dificuldade no relacionamento com os colegas".
Em relação às próprias condições, os dados são mais convergentes no que dizem respeito à insegurança, à dificuldade em aceitar a deficiência, às dificuldades na escola, à falta de autonomia, à dificuldade na comunicação social e ao fato de segregarem-se convivendo apenas com pessoas portadoras de deficiência.
Em relação ao contexto social, a condição, falta de aceitação na comunidade e preconceito social, esteve presente em seis relatos. As quatro alunas com deficiência visual disseram que não se sentiam aceitas na comunidade e citaram atitudes como chamarem-nas de "ceguinha”, atribuírem falta de capacidade para realizarem atividades simples, falta de estrutura do mercado de trabalho, o olhar do outro frente à deficiência, diagnóstico tardio. Duas alunas com deficiência auditiva comentaram atitudes de preconceito, como medo de falar com elas ou discriminação para conseguir emprego. Em três relatos de estudantes com PC foram destacados a discriminação e o preconceito dos professores a respeito da deficiência, quando sugeriram que o curso universitário escolhido não era apropriado ao aluno, não acreditando na capacidade dele e não aceitação do aluno em sala de aula.
Não trabalhar esteve presente nos quatro relatos de estudantes com paralisia cerebral, que também disseram terem sofrido discriminação e preconceito em instituições.
Ao se considerar, como já assinalado, que o item mais convergente acerca das condições que dificultam a inclusão foi a falta de aceitação na comunidade e o preconceito social, era esperado que, nas condições próprias, aparecessem dados relacionados à inadequação social, à insegurança, ao receio de não ser aceito, às dificuldades sofridas na escola, à falta de autonomia, etc.
Cabe comentar como ao falar do despreparo dos professores, cada um dos três grupos de alunos com deficiência se refere a diferentes atitudes dos professores: com os
estudantes com deficiência visual os professores se portam de modo complacente, cobram menos desses alunos; dos estudantes com deficiência auditiva não atendem às solicitações dos alunos de falar de frente para o aluno distraem - se, parecendo não ouvi-los; aos estudantes com paralisia cerebral desaconselham a fazerem o curso e queixam-se de que perturbam a concentração dos colegas, quando ficam na classe.
A efetivação da inclusão requer clareza sobre situações concretas de convívio: clareza sobre a própria ação, sobre a própria concepção a respeito de pessoa com deficiência; de ter em classe um aluno com deficiência, sobre os próprios sentimentos, sobre as crenças nas possibilidades de um estudante com deficiência (visual, ou auditiva ou com paralisia cerebral) e conseqüentes expectativas e exigências sobre o que ele realiza. É um trabalho que vai se constituindo ao longo do tempo...não se constrói e finaliza em um período fixo de duração...requer continuidade para que o educando se sinta contido na escola apto a participar e contribuir para a comunidade educacional a qual tenha o sentimento de pertencer.

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[1] Esta pesquisa contou ainda com Miriam Araujo como auxiliar de pesquisa. – IC CNPq - Aluna de Psicologia da UPM e de Renato C. Tardivo como auxiliar de pesquisa _ IC CNPq – Aluno de Psicologia da USP.
[2] Pesquisasora Responsável, Dra em Psicologia da Educação; Livre Docente em Educação Especial
[3] Psicóloga – voluntária Mestranda em Distúrbios do Desenvolvimento (UPM).